4.2.14

a verdade é que tenho um medo de amar devassador. confesso porque acredito que toda confissão é uma espécie de espelho, porque ao se ver num espelho acontece o reconhecimento, a percepção, mesmo que lenta, de si mesmo. o externo que desperta o interior. a confissão não crucifixa, antes liberta. é meio caminho andado à resolução: a coisa/sentimento torna-se mais conhecido, já é possível buscar suas raízes, sua profundeza, a origem, pistas para encontrar a iluminação, o desatar! então eu confesso: tenho medo de amar. agora confesso que não sei o que fazer dessa confissão. a verdade é que sou econômica nos meus atos e exagerada na imaginação. e ser exagerada na imaginação desacerta meus atos, não tenho equilíbrio. faço tudo errado. parece errado. ou apressado. ou tardio. nunca no tempo certo, descompassada. tenho vontade de dizer isso pro ser amado: tenho medo de te amar. não tenho medo de amar os amigos, os bichos. mas tenho medo de te amar. tenho medo de ser rejeitada, embora eu não creia que há rejeição nas relações, há vida que segue, roda da fortuna, amor que acaba ou nem começa. tenho medo de ser ridícula, de ser poeta, piegas, ser o que eu sou. que horror, quando estou apaixonada tenho medo de ser quem eu sou. isso é grave. é péssimo, gente. e eu gosto de mim, tenho gostado cada dia mais. talvez eu precise de tempo e ficar só e ver se gosto da minha companhia estranha, avoada e boba que acha bonito uma rachadura na parede. dói tanto confessar tenho medo de amar. com toda certeza isso não é escolha, eu não escolhi temer o amor e seus infortúnios. deve ser um processo histórico, deus queira, mais antigo que eu, nasceu da época em que as mulheres talvez nem tinham a oportunidade de conhecer o amor, pois não tinham o poder de escolher seus amados amantes. não tinham a oportunidade de desacertar e consertar e tentar de novo e descasar e piriguetar até encontrar dentro de si os calos de amar e desamar sem medo.
educação sentimental envolve tentativas, risco! preciso enfiar isso na minha cabeça de uma vez por todas: no desconhecido é que mora a graça. não tema o desconhecido, daniela, não tema. porque amor, gente, sentimento, emoção, climatempo, os fins e os começos, a vida, tudo isso é novidade. não queira saber de nada, não queira adivinhar o outro, só queira...



primavera/dezembro, 2013